Caros,
Vimos disponibilizar artigo científico/projeto que fundamenta filosoficamente e de modo interdisciplinar o L'ArCA. Este paper será publicado ainda neste semestre em coletânea que reúne textos do V Encontro Anual da Associação Nacional de Direitos Humanos - ANDHEP, intitulada
Direitos Humanos, Diversidade e Democracia, e organizada pelos profs. Eduardo Bittar (USP), Jane Beltrão (UFPA) e por mim.
Boa leitura!
Abraços,
Vitor Blotta
Metodologias Alternativas para a Educação em Direitos Humanos
O Laboratório de Arte e Cidadania Ativa
Para Eduardo Manoel de Brito
(1978-2009)
Introdução
Este artigo pretende fundamentar de modo interdisciplinar a proposta de um novo método pedagógico que trabalha a educação em (e para os) direitos humanos e o fomento de práticas de cidadania ativa por meio de oficinas de criação artística coletiva. Trata-se do
Laboratório de Arte e Cidadania Ativa (L’ArCA), cujas bases teóricas, características e resultados práticos serão aqui apresentados, o que não obsta práticas semelhantes de se sustentarem sob as mesmas mesmas justificativas. Em termos de política educacional, objetiva-se fortalecer especialmente dois dos pilares da educação erigidos pelo Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos
: a educação não-formal e a educação para mídia.
Como o ponto de partida do método é o contato com notícias, temas atuais, ou mesmo situações fictícias relacionados a problemas de direitos humanos em debate nas esferas públicas nacionais ou internacional
, busca-se também estimular o envolvimento dos educandos, satisfazer a necessidade de constante atualização e contextualização do conhecimento, além de promover a importante abordagem de problemas
práticos, sempre presentes em discussões sobre direitos humanos.
A fundamentação filosófica do método a ser proposto exige primeiramente uma mudança de perspectiva desde a
teoria do conhecimento, que será aqui realizada a partir de uma comparação das formas com as quais as chamadas
Teoria Tradicional e a
Teoria Crítica, encaram a idéia de “fato” ou “realidade”. A partir dessa distinção, será possível traçar um paralelo com o debate entre cidadania passiva e ativa, já que se tratam também de formas de se agir perante a realidade.
Essa busca por uma interpretação crítica dos fatos e a necessidade de se promover processos de aprendizado diferenciados, debates frutíferos a respeito dos direitos humanos e práticas de cidadania ativa, levanta necessariamente uma complexa questão a ser aqui enfrentada: se é verdade que as
expressões simbólicas, ou as opiniões
dos cidadãos contribuem para
constituir a realidade e orientar a ação social, como
convencer as pessoas de que a manifestação de suas opiniões a respeito de temas presentes no debate público é imprescindível, além de que podem e
devem influenciar as tomadas de decisão nos assuntos que lhes concernem?
A hipótese que possivelmente responde a esta questão abrirá espaço para as contribuições da arte às reflexões deste artigo, pois apesar de suas ambivalências
, pretende-se defender aqui que a arte contém quatro características que podem contribuir a esse “convencimento” para um incremento agir prático na esfera pública: a arte é uma forma de
potencialização da expressão simbólica (dimensão lingüística); contém uma dimensão crítica e possivelmente emancipatória das condições de conservação do real (dimensão política), e, portanto, do poder
; promove uma valorização da auto-estima, por meio de uma experiência terapêutica de autoconhecimento (dimensão psicológica); e, por fim, possibilita uma sublimação positiva de castrações da libido promovidas pelo convívio em sociedade (dimensão psicanalítica), a partir do
reconhecimento social dos símbolos intersubjetivamente partilhados.
Como última reflexão do artigo, serão apresentadas as razões pelas quais se entende que o método pedagógico a ser proposto pode contribuir especificamente para o debate acerca dos direitos humanos e de seus modelos de ensino. No entanto, apesar desse foco temático na área dos direitos humanos, pretende-se tornar claro que questões práticas relacionadas a qualquer área do saber podem também utilizar esse método como modelo de educação não-formal e de ensino crítico sobre a mídia de modo geral, incluindo aí meios eletrônicos e de imprensa.
Salienta-se, por fim, que se trata de método já testado com educandos do ensino superior e médio. Algumas das expectativas dos participantes e resultados das experiências serão relatados no decorrer do artigo para ilustrar e possivelmente comprovar a eficácia da proposta em relação aos objetivos aqui pretendidos.
1. Abordagem teórica: teoria tradicional, teoria crítica e as definições de “fato”
Se este artigo pretende fundamentar uma metodologia alternativa de educação não-formal desde uma abordagem crítica de notícias e temas veiculados nos meios de comunicação de massa ou em obras fictícias cujos discursos pretendem apresentar a “realidade dos fatos”, exige-se antes de tudo uma breve reflexão epistemológica, da qual serão destacadas comparativamente distintas formas de se definir a idéia de “fato”.
A criação da
teoria do conhecimento como disciplina autônoma da filosofia é atribuída a Immanuel Kant
, posto que estabeleceu, a partir de uma releitura de Aristóteles, as condições de possibilidade da formação de um conhecimento “puro”, ou independente das contingências da natureza e dos sujeitos individuais.
Essa distinção de Kant entre o mundo
inteligível (das certezas matemáticas às leis universais da natureza e do dever moral) e o mundo
fenomênico (das emoções e inclinações “meramente” subjetivas), remonta, no entanto, à lógica de Parmênides, ao idealismo platônico e, já na modernidade, primeiramente ao cartesianismo, o que influencia mais à frente - no século XX - à fenomenologia husserliana.
O que essas tradições filosóficas têm em comum, portanto, é a pretensão de que é possível conceber a
objetividade do mundo
apesar de suas condições subjetivas e espaço-temporais. Em outras palavras, separa-se de modo estanque o sujeito do objeto, sendo que o objeto, como um fato, torna-se “objetivo” ao se identificar com a representação mental dele tida pelo sujeito cognoscente. Não obstante, a partir dessa possível “objetividade pura”, tanto o filósofo como o cientista seriam capazes de descobrir e descrever leis universais que interligam os fatos ou objetos por relações de
causalidade.
Esse seria, grosso modo, o núcleo epistemológico do que Max Horkheimer denomina
Teoria Tradicional, para a qual um fato se resume à identidade entre natureza externa e pensamento, apesar de alguns autores tidos como “tradicionais”, como Kant e Husserl reconhecerem obscuridades, contingências e interesses que permeiam o processo de conhecimento.
Assim, para a teoria tradicional, um fato seria “aquilo que é”, ou que se tem como “dado”, independentemente do que o sujeito pensa, diz ou faz em relação a ele, posto que as leis universais do pensamento objetivo (e.g. o princípio da não-contradição na lógica formal), apesar de utilizadas de modo mais corrente pelos experts, independeriam até mesmo deles para resultar numa apreensão verdadeira do ser.
No entanto, já que conceber leis universais do pensamento sem seres humanos para pensá-las e exprimi-las parece algo deveras contra-intuitivo, a credibilidade prática atribuída a certos tipos de conhecimento e aos atores que os manipulam acaba inevitavelmente por gerar uma relação unilateral entre estes - que dizem o que “é”-, e aqueles que recebem a informação. Nesse sentido, autoridades, especialistas, instituições (como a mídia em sua função de “relatar os fatos”), passam a gozar de uma “competência” maior do que outras pessoas para descrever a realidade, enfraquecendo cada vez mais - pública e psiquicamente - a força constitutiva do real contida nas opiniões desses outros.
Já para a
Teoria Crítica, que tem suas origens na crítica de Hegel ao transcendentalismo kantiano
, na inversão do idealismo hegeliano por Marx e, posteriormente, na revisão de Marx pelos frankfurtianos
, o processo de conhecimento não pode ocorrer por uma separação radical entre sujeito e objeto, posto que, de um lado, o objeto pensado não existe sem alguém concreto que o pense, e de outro, não se pode pensar no ser humano concreto sem uma reflexão sobre as condições de possibilidade da própria objetividade do pensamento.
Os conceitos de sujeito e objeto teriam, portanto, uma imanência recíproca, não sendo o primeiro mera subjetividade incondicionada (o “Eu” burguês individual, a coletividade homogeneizante do Leviatã ou da
voluntas generalis rousseauniana) e tampouco o segundo facticidade “bruta”. Para Horkheimer, o sujeito se torna uma “construção do presente histórico”, enquanto que o objeto (ou um fato) é concebido como um
conjunto de elementos de acontecimentos captados pela percepção e organizados de forma simbólica e inteligível. Ou seja, dependente de sua relação com os sujeitos.
Por fim, o modelo
habermasiano de teoria crítica
traz também uma concepção diferenciada da idéia de “fato”, e será adotada como perspectiva teórica deste estudo porque ressalta ainda mais a importância da
linguagem e da
opinião de
toda uma “comunidade lingüística” na constituição da realidade. Trabalhando já num registro da filosofia da linguagem, pode-se dizer muito resumidamente que Habermas - ao criticar a concepção
referencialista da verdade (Frege) e adotar a perspectiva
pragmática da “comunidade de investigadores”
de Peirce - entende a noção de “fato” como a presumida aceitação motivada de asserções constativas sobre objetos e/ou estados de coisas pelos membros de uma comunidade lingüística.
Em outras palavras, um fato seria um consenso momentâneo de duas ou mais pessoas sobre a verdade de uma opinião em relação a um objeto ou acontecimento. Com isso, Habermas procura abandonar a dicotomia entre sujeito e objeto pela adoção de um modelo
intersubjetivo e
lingüístico-pragmático de racionalidade, o que significa dizer que só é possível pensar o mundo exterior (ou um fato) e o mundo interior (os sentimentos pessoais) - bem como justificar as tomadas de decisão - dentro de um espaço inevitavelmente compartilhado pela linguagem, tida aqui em sentido amplo.
Além disso, Habermas limita
a idéia de fato a um consenso criticável e sujeito à explicação sobre uma pretensão
universalizante de verdade presente em
atos de fala que descrevem estados de coisas ou eventos, como a simples constatação “está chovendo”. Esse caráter universalizante estaria implicitamente presente, pois quando um sujeito falante que descreve uma situação, inevitavelmente o fará em algum momento de modo a reportar-se a um sem número de ouvintes que poderiam dar o mesmo significado à sua expressão.
Com isso, pode-se dizer que, se a objetividade de um fato depende da forma como uma “comunidade de interpretação
em geral” o encara - ou seja, depende da
opinião dos outros possíveis falantes-ouvintes, que podem problematizá-la e exigir dela uma explicação -, haveria na idéia de fato uma certa “
maleabilidade”
intersubjetiva.
Para a teoria crítica, portanto, cuja abordagem é adotada pelo L’ArCA, fato seria aquilo que
se diz que “é”, somado ao que “
pode ser”, ou que “
deve ser”, posto que se sujeita a uma aceitabilidade motivada de sua pretensão verdade por todos os potenciais ouvintes e intérpretes membros da comunidade concernida.
2. Da cidadania passiva à ativa: potencialidades e limitações
O paralelo que se pode traçar entre a reflexão anterior e o debate entre cidadania ativa e passiva traz, de um lado, as potencialidades abertas pela teoria crítica para estimular uma ação transformadora e não somente adaptativa em relação ao mundo, mas também evidencia as limitações desse estímulo. Assim, após apresentadas de modo sintético a tensão entre cidadania passiva e ativa e sua relação com a teoria crítica, serão também apresentados possíveis limites desse modelo, que refletem na educação (e mais especificamente na educação em e para os direitos humanos), o que abre espaço para a discussão sobre a importância da arte nesse contexto, em seguida.
Segundo Eduardo Bittar, a concepção político-jurídica
tradicional de cidadania se refere à
pertença a um Estado e a capacidade de exercício de direitos políticos restritos ao voto e à candidatura para compor quadros do poder público. Essa concepção “técnico-funcional” de cidadania acabaria por englobar tanto uma noção de cidadania
passiva (
e.g. condição de titular do direito político de ser votado), como de cidadania
ativa (
e.g. direito de votar). No entanto, trata-se ainda de direitos meramente
formais que teoricamente garantem a possibilidade de todos exercê-los concretamente, mas não permite evidenciar e dar esteio político às diferentes e contraditórias demandas sociais e individuais de sociedades complexas.
Assim, estar-se-ia diante da necessidade de uma revisão e
ampliação da idéia de cidadania, que compreende até mesmo uma espécie de
responsabilidade de constante cobrança, participação e busca por ampliação do acesso às tomadas de decisão das questões que afetam a todos. Essa concepção de cidadania
ativa é compartilhada por Habermas, Bittar, Herkenhoff, e também por Herbert de Souza, o Betinho, posto que para todos, depende de uma atitude pró-ativa, não-conformista dos “parceiros do direito” em relação aos problemas comuns.
Com essa mudança de atitude, o paciente se torna agente, ou, nas palavras de Habermas, o observador assume a perspectiva do
participante,
o que completa o fluxo de circulação política do Estado Democrático de Direito: leis devem respeitar normas e princípios superiores (legalidade), mas também devem garantir a problematização e o possível consentimento da população em relação aos motivos de serem aceitas como válidas (legitimidade). E não só esta última parte do processo, mas também as pressões sociais para a institucionalização de normas são construídas com práticas de cidadania ativa.
Portanto, assumir essa perspectiva de um participante de uma “comunidade de parceiros do direito” - que deve ter a esfera de sua autonomia individual garantida pela legalidade e protegida pela força coercitiva do Estado, e ao mesmo tempo procurar legitimar essa legalidade e coercibilidade pela defesa e apoio à abertura de espaços de exercício da autonomia política -, significa não só a passagem de uma condição de cidadania passiva para uma cidadania ativa como ação (recuperando da reflexão anterior a abordagem epistemológica da teoria crítica), mas também que a opinião de todos os membros da comunidade política é essencial para que haja uma correlação de equilíbrio entre o direito “querido” e o direito “de fato” – semelhante àquela entre sujeito e objeto.
Com isso, chega-se a uma formulação mais específica da questão que iniciou este artigo: a
consciência de que a constituição da realidade e as formas de com ela se interagir - como também a passagem da cidadania passiva para a ativa
-,
dependem de modo
imanente das opiniões ativas, confirmadoras e/ou problematizantes de
todos os participantes das comunidades concernidas a respeito de estados de coisas e problemas comuns,
é suficiente para gerar o estímulo necessário à prática efetiva desse tipo de agir político?
Parece que não. Mesmo que para Habermas o paradigma
procedimental do direito teria o condão de suplantar a fraca motivação da ação que encerra a razão comunicativa
, garantindo a influência do agir comunicativo sobre as formas atuais de integração social
, teme-se dizer que a
motivação para um agir autônomo, socializante, conformador e/ ou problematizador das normas sociais, isto é, o
estímulo a práticas
efetivas de cidadania ativa, ainda requer esforços de outra ordem.
Se nem a religião ou a moral garantem mais essa “motivação interna” para o agir público sem incorrer em modelos autoritários de coordenação da ação (Habermas, 1984-II:43-112), talvez algumas reflexões sobre as relações entre educação, educação em direitos humanos, estética, psicologia e psicanálise possam oxigenar esses debates, normalmente centrados em temas clássicos da filosofia política.
3. Educação, educação para os direitos humanos e arte: a importância sociopolítica e psicológica de uma “linguagem banida”
Educação em (e para os) Direitos Humanos: a importância do debate público
Esta breve reflexão sobre educação e educação em direitos humanos pretende sugerir um breve panorama da condição atual da educação e o impacto que a educação em direitos humanos pode nela provocar, o que abre espaço para a discussão seguinte de suas relações com a arte.
Quando se pensa na dificuldade de se estimular práticas de cidadania ativa em estados democráticos de direito como o Brasil, cuja cultura democrática ainda é historicamente incipiente, além de tradicionalmente ligada a uma concepção formal de democracia, as respostas mais comuns recaem sobre a urgência de uma “educação do povo para uma cultura democrática participativa”. Entretanto, as condições das práticas educativas e as amarras atuais do sistema educacional brasileiro com imperativos mercadológicos tornam essas respostas meras palavras desesperançosas lançadas ao vento.
Essa constatação é explicada pelo interessante diagnóstico do tempo presente da educação apresentado por Paulo Freire nas “primeiras palavras” de Pedagogia da Autonomia, convergindo com as reflexões até agora apresentadas ao destacar de forma negativa o grande problema a ser enfrentado pela educação nesse contexto:
“A ideologia fatalista, imobilizante, que anima o discurso neoliberal anda solta no mundo. Com ares de pós-modernidade, insiste em convencer-nos de que nada podemos contra a realidade social que, de histórica e cultural, passa a ser ou a virar ‘quase natural’. Frases como ‘a realidade é assim mesmo, que podemos fazer?’ ou ‘o desemprego no mundo é uma fatalidade do fim do século’ expressam bem o fatalismo desta ideologia e sua indiscutível vontade imobilizadora. Do ponto de vista de tal ideologia só há uma saída para a prática educativa: adaptar o educando a esta realidade que não pode ser mudada. O que se precisa, por isso mesmo, é o treino técnico indispensável à adaptação do educando, à sua sobrevivência” (Freire, Pedagogia da Autonomia, 1998, pp. 21-22. grifos nossos).
Bittar também diagnostica alguns obstáculos internos à educação formal que dificultam uma retomada da educação como processo formativo e capaz de fazer frente aos imperativos da sociedade de consumo. A idéia de que o educando precisa ser somente convencido da validade do conhecimento que lhe é transmitido, a excessiva erudição que dificulta interiorizações críticas, a distância entre “realidade ideada e realidade vivida”, o apelo teórico e a especialização dos conteúdos são algumas das características que precisariam ser combatidas pela educação em direitos humanos (Bittar, 2007:323).
É contra esse quadro, aqui muito rapidamente apresentado, que as recentes formulações epistemológicas e metodológicas da educação em (e para os) direitos humanos tem se direcionado, no sentido de trazer uma espécie de revisão crítica das atuais práticas educativas humanistas. E ainda que não ataque diretamente os vínculos da educação com modelo econômico de mercado, a educação em direitos humanos pode lançar uma nova luz sobre que tipo de educação seria capaz de estimular novas práticas de cidadania ativa e participação política no Brasil.
Bittar trabalha sua reflexão sobre a educação em (e para os) direitos humanos a partir do estudo de Theodor Adorno
em Educação Após Auschwitz (original de 1969). Da mesma forma que Adorno na resposta à pergunta sobre a “possibilidade de poesia após Auschwitz”, Bittar pensa a educação como desenvolvimento da
auto-determinação individual e da
autenticidade/originalidade dos educandos. Somente esse tipo de experiência de ensino/aprendizado permitiria a prática da
auto-reflexão necessária à dialética negativa
, esta que, por sua vez, seria a única forma de racionalidade – e, portanto, de possível prática educativa - capaz de impedir a incursão do pensamento em suas próprias armadilhas de dominação, como teria ocorrido na “barbárie racionalizada” de Auschwitz (Bittar, 2007:318).
É para trabalhar o desenvolvimento da autodeterminação individual, no sentido de uma “recuperação da capacidade de sentir e pensar” do educando, que Bittar sugere práticas pedagógicas diferenciadas no panorama da educação em direitos humanos. A utilização de imagens e vídeos para discutir e retomar a sensibilidade visual dos educandos; a permissão para o aluno interferir e reagir às práticas pedagógicas, opinando sobre seu conteúdo e método; a possibilidade do educando vivenciar experiências de contato com a alteridade, ainda que em práticas de simulação teatral, por exemplo; além da capacidade de ouvir e falar, com estímulos musicais e atividades de debates mais do que aulas expositivas. É por isso que ao entrecruzar conteúdos didáticos com poesia, literatura, pintura, cinema, teatro, entre outras modalidades artísticas, torna-se possível promover experiências “ético-estéticas” que reabilitam “o potencial transformador da educação, e, portanto, do ensino jurídico” (Bittar, 323-324).
Na educação em (e para os) direitos humanos, esse tipo de prática pedagógica diferenciada é fundamental, visto que se procura evitar uma concepção de direitos humanos como meras declarações de direitos, tratados, normas constitucionais e leis distantes dos cidadãos e que, em muitos casos, carecem de aplicabilidade prática. Ao contrário disso, a revisão da epistemologia clássica pela teoria crítica demonstra que temas práticos como os direitos humanos são insuficientemente apreendidos quando vistos à parte do debate público que se faz em torno deles (v. tópico 1 deste estudo).
Um importante diferencial possibilitado pelo entrecruzamento de temas de direitos humanos com práticas pedagógicas ligadas a
expressões artísticas, atividade específica do L’ArCA, é o descompromisso da expressão da subjetividade individual com as formas convencionais do discurso prático, o que lhe permite alcançar um público apesar de não constituir imediatamente uma pretensão política. Nesse momento, a “politização da arte”, enfatizada, porém não aprofundada por Walter Benjamin no célebre ensaio “A Obra de Arte na Era de sua Reprodutibilidade Técnica” (1936)
, não se confunde com a estetização da política, pois não se vale da instrumentalização do fazer artístico. Pelo contrário, no momento em que a arte se torna expressão da subjetividade individual nas pretensões de autenticidade e sinceridade dos discursos estético e expressivo, ela se politiza sem perder sua autonomia, podendo influenciar a ação cidadã de modo não-autoritário, já que é, de certo modo, desprovida de uma intencionalidade explícita.
É nesse sentido que o papel da arte sobre a política, ou mesmo sobre a filosofia, se assemelha com o papel da educação em direitos humanos nas práticas convencionais da educação em disciplinas das humanidades. Se a estética teria a capacidade de revelar à filosofia o “não-conceituável pelo conceito”, isto é, aquilo que é inapreensível pelos discursos teórico e prático (Barbosa, 1996:47-49 e 51-54), ao incorporar formas do discurso estético-expressivo, a educação em direitos humanos dá condições para que a educação trabalhe esses veículos de expressão da subjetividade individual sem os quais a pretensão de autonomia não exerce todo seu potencial.
Trata-se, portanto, de retomar as condições de expressão autêntica da autonomia individual – uma autonomia “não-individualista” (v. tópico abaixo) - que se encontram obstadas tanto pela cultura do consumo quanto pela pedagogia conformista denunciada acima por Freire. Mas ainda sim, para que a arte se politize sem se converter num novo instrumento de dominação, algumas reflexões sobre sua condição presente também se fazem necessárias.
Arte e racionalidade estético-expressiva: banimento do espaço público e funções sociopolíticas e psicológicas
Primeiramente, para situar o lugar da arte no contexto cultural atual, pode ser feito uso da tese weberiana da diferenciação das três “esferas de valor” da razão na modernidade. Nessa divisão tripartite entre técnica, moral e arte, a
eficiência da primeira esfera na gestão dos processos econômicos e burocráticos levou gradativamente à sua supervalorização em detrimento das outras duas.
Como sintomas desse processo, ocorrem tanto uma “dessubstancialização” da moral como uma
desvalorização da racionalidade prática da arte, sendo ambas relegadas à “irracionalidade da esfera privada” e especialmente a última ao processo de industrialização e “pasteurização” da cultura de massa.
Essa desvalorização da racionalidade prática da arte significa dizer que parece haver atualmente um consenso em relação à idéia de que não seria possível justificar pública e convincentemente ações e tomadas de decisão políticas a partir de experiências estéticas. Ou seja, a arte seria, então, mera expressão irracional de um sentimento do indivíduo. Além disso, esse suposto consenso teria como motivo a própria idéia de que as expressões artísticas e as percepções e opiniões sobre a arte são sempre de cunho subjetivo e individual. A expressão popular que traduz essa posição é a conhecida “gosto não se discute”.
Duarte Júnior contesta ambas essas teses argumentando que a expressão artística e a percepção sobre a arte não são somente subjetivas e tampouco objetivas, pois
“... a capacidade expressiva do artista reside justamente em sua sensibilidade para captar os meandros dos sentimentos da comunidade humana e exprimi-los em formas Simbólicas. É óbvio que esta captação ele a realiza a partir dos seus sentimentos e de sua ‘visão de mundo’, mas afirmar que o artista exprime somente os seus próprios sentimentos é restringir e empobrecer a sua práxis... O artista, então, capta os sentimentos de sua época e comunidade, exprimindo-os a partir de suas experiências pessoais, de seu ‘sentir-se no mundo’.” (Duarte Júnior, Fundamentos Estéticos da Educação, 1981, pp. 77-78).
Assim, se a experiência estética não seria nem mera expressão subjetiva e nem a captação isenta de um “sentimento coletivo e objetivo da comunidade humana” ausente da subjetividade do artista ou do contemplador de uma obra, abre-se espaço para uma aproximação muito clara entre a tentativa de rompimento com filosofia da consciência que a teoria crítica procura realizar em relação à teoria tradicional, especialmente na vertente habermasiana da racionalidade como faculdade constituída - e constatada – pela intersubjetividade lingüística.
Habermas não chega a aprofundar em sua obra o potencial prático da racionalidade estética, o que lhe rende algumas críticas
, mas suas reflexões em
Teoria do Agir Comunicativo oferecem condições para se pensar, sim, no “banimento” da razão estética do “espaço público” junto à razão moral, na esteira de Weber, além de seu caráter inalienavelmente prático, apesar de ser a mais “subjetiva” forma de racionalidade diferenciada pela modernidade.
No entanto, no plano político, a força crítica e mobilizadora da arte dificilmente pode ser negada, especialmente quando se pensa, nas artes plásticas, em Goya para a Revolução Francesa, Picasso na Guerra Civil espanhola e Diego Rivera na Guerra Fria; no teatro brechtiano à causa socialista, no jornalismo fotográfico de Nick Ut
(autor da foto de uma menina correndo nua numa estrada após um bombardeio em Nepalm [1972]) ou na obra de Sebastião Salgado; na música de John Lennon e Bob Dylan para a Guerra do Vietnã, de Chico Buarque e Geraldo Vandré na ditadura militar brasileira e do U2 de Bono Vox nos conflitos separatistas na Irlanda.
Ao mesmo tempo, a estética pode muito bem não servir à emancipação de condições de dominação social, mas à também à própria manipulação da racionalidade pública e a mobilização social orientadas por determinadas diretrizes de ação pouco abertas à crítica.
Isso foi constatado de forma exemplar na utilização da estética nazi-fascista de Joseph-Goebbels e da cineasta Leni Riefenstahl para provocar a aceitação do povo alemão em relação ao terceiro
Reich, mas não deixa de figurar no tempo presente com o fenômeno do populismo midiático e outras novas formas de estetização da política.
Do mesmo modo, a célebre crítica da Indústria Cultural de Adorno e Horkheimer indica a utilização do cinema hollywoodiano e da então incipiente televisão como meios de se criar uma cultura de consumo orientada para a “domesticação política” nos regimes capitalistas ocidentais.
Além disso, em contextos de organizações tradicionais de costumes, como cultos religiosos, também são expressões estéticas que auxiliam a necessária padronização objetiva das condutas dos fiéis.
Pode-se concluir dessas breves reflexões, portanto, que não seria a arte propriamente dita que se tornou uma linguagem
banida do espaço público. As dimensões estéticas das formas culturais estão cada vez mais presentes nos meios de comunicação e na comunicação cotidiana, como é o caso da cultura de massas e da publicidade comercial desde meados do século XX.
O que se entende estarem banidos da esfera pública são:
1.
As exatas dimensões em que a arte se relaciona com a política, isto é, a dimensão prática dos discursos estético-expressivos. A ausência de uma discussão séria sobre esse tema faz com que, por um lado, esses discursos sejam tidos como expressões por demais subjetivistas e pessoais, enquanto que de outro, sua utilização em práticas de estetização da política é feita sem um escrutínio público preparado para criticá-lo.
2.
A possibilidade fruição, pela maioria da população, do direito de expressão artístico-cultural (art. 5º, IX, CF/88
),
no sentido de serem proporcionadas a todos, e não somente a poucos, condições de se realizar manifestações artístico-culturais (ou estético-expressivas) que tenham espaço e impacto na esfera pública.
3. O conhecimento das formas com que a arte se relaciona com a psicologia humana a ponto de motivar a ação, seja ela emancipatória ou expressão de algum tipo de dominação. Apesar de fazer parte do primeiro ponto apresentado, procura-se aqui destacar a questão psicológica em função de sua importância na nova metodologia de educação em direitos humanos a ser apresentada ao final do estudo, especialmente quando se defende que essa metodologia é capaz de despertar práticas de cidadania ativa.
Em termos morais e psicológicos, deve-se ressaltar a importância da arte para a auto-realização individual e o fortalecimento da autoestima. Se é certo que os discursos estético e expressivo representam veículos de expressão da subjetividade interior carregadas respectivamente de pretensões de autenticidade e sinceridade (Habermas, 1984-I:I-66-70 e 75-76), não se pode negar sua influência sobre a formação da personalidade individual, que é, segundo Habermas, junto à sociedade e à cultura, um dos componentes estruturais do mundo da vida. Nesse sentido, quanto menos constrangidos são esses discursos no interior de processos de aprendizagem, mais se colabora para processos de individuação, o que segundo Jung significa um desenvolvimento maduro e saudável da personalidade (J Franz, M.-L, 2002:161).
Nesse entrecruzamento de teoria moral e psicologia, a teoria do reconhecimento elaborada por Axel Honneth a partir de estudos do jovem Hegel sugere que a autoestima é o resultado da forma de reconhecimento ligada aos afetos da família e do amor. A ausência de condições para o exercício dessa forma de reconhecimento, que poderiam ser retomadas em experiências estéticas e artísticas, gera inevitavelmente patologias sociais.
Durkheim também defendeu tese semelhante em seus estudos sobre a sociologia da religião, analisados por Habermas no segundo e terceiro tópico do capítulo V de The Theory of Communicative Action (1984-II:64-94), quando ressaltou os processos modernos de individuação como fundamentais para a estabilização das tensões morais e da solidariedade que mantém a coesão da integração social em sociedades modernas. A implicação dessas reflexões de Honneth e Durkheim sobre a questão da cidadania ativa, discutida acima, fica evidente.
Já a conexão entre arte e psicanálise deriva da idéia de que o inconsciente é estruturado por uma linguagem de símbolos, ou do “imaginário”, e por isso afetos, desejos e impulsos encontrariam suas instáveis identificações e satisfações em sons, imagens e em outras formas de expressão artística que trabalham aspectos sensoriais do ser humano
. É por isso que a experiência estética, ao permitir expressões autênticas e sinceras do indivíduo, pode realizar processos de individuação na forma saudável de sublimações dos desejos, capazes de provocar efeitos terapêuticos.
No registro da epistemologia crítica intersubjetiva trabalhada no primeiro tópico deste artigo, Habermas identifica como Freud relacionou uma neurose no plano individual com uma instituição no plano social. A partir dessa análise, realizada nos estudos do filósofo sobre psicanálise em Conhecimento e Interesse, original de 1968, torna-se possível pensar num modelo de “circulação de impulsos sociais”, que seriam “linguistificados” em instituições na forma de normas morais ou jurídicas. Segundo Habermas, a capacidade dessas instituições em promover autocríticas e se abrir a críticas externas determinaria se se tratam de sublimações ou repressões e negações. No caso das duas últimas, os desejos seriam “des-linguistificados”, ou impedidos de se “linguistificar”, em função de obstáculos encontrados na comunicação pública, como valores culturais (Habermas, 2002b:214-300; Rouanet: 1998; Blotta, 2009).
É com essas reflexões que se pode afirmar que a retomada da compreensão das funções práticas da arte e da estética em geral, bem como de sua importância psicológica e psicanalítica, que fundamentam o método alternativo de educação em seguida proposto, podem colaborar com os discursos teóricos e práticos no sentido de estimular práticas de cidadania ativa desde o plano individual.
Ao mesmo tempo, espera-se que essas perspectivas também contribuam para processos de auto-reflexão institucional - seja na educação, na política, no debate público ou mesmo na academia - que lhes prepare cada vez mais para filtrar de modo não violento impulsos que não expressam outra coisa senão pretensões de individuação, ainda que elas mesmas ocorram muitas vezes de modo negativo e violento. Quanto mais as instituições sociais qualificarem essa função que lhe cabe, a de facilitar e garantir processos de “auto-reflexão social” (Blotta, 2010a), mais estimulados ainda se sentirão os indivíduos para engajar em práticas de cidadania ativa que irrompam para esfera pública.
4. Metodologia das oficinas, relações com os resultados do estudo e efeitos práticos.
Por fim, a metodologia alternativa de educação em direitos humanos do Laboratório de Arte e Cidadania Ativa (L’ArCA), até aqui fundamentada de modo interdisciplinar, será apresentada em tópicos intercalados por mais algumas considerações específicas ligadas à metodologia e de resultados de aplicações práticas de atividades semelhantes já realizadas.
Se as reflexões e argumentos formulados neste estudo podem ser considerados válidos, torna-se possível afirmar que oficinas de criação artística coletiva como as realizadas pelo L’ArCA, que trabalham com temas práticos como direitos humanos são capazes não somente de gerar processos de aprendizagem diferenciados, mas também estimulam práticas de cidadania ativa. Isso porque 1. podem liberar formas obstruídas de expressão da autonomia individual que colaboram para processos de individuação pela socialização, aumentando autoestima e a confiança do indivíduo que adentra espaços públicos; 2. melhoram a compreensão e ampliam o alcance de aplicação do discurso prático em relação ao estético-expressivo, permitindo que se exija essa ampliação não só em interações simples, mas também nas práticas de instituições sociais; 3. promovem experiências terapêuticas
e de sublimação dos desejos, reprimidos por uma comunicação pública dominada pelas concentradas mídias de massa e orientada pelo setores de consumo cultural e a marketing político.
Apresentação dos fundamentos da oficina
Pode ser realizada inicialmente breve explicação baseada nos argumentos deste artigo. Uma opção interessante é intercalar a explicação com a projeção de imagens e referências aos argumentos, ou mesmo apresentações artísticas que exemplificam o que será criado a partir da oficina. A utilização de rápidos exercícios de aquecimento corporal e vocal com os participantes em alguns momentos da explicação também auxilia na manutenção do interesse de todos. O humor é outro recurso que energiza o ambiente e colabora para aumentar a disposição dos participantes para as atividades.
Apresentação da notícia ou tema e discussão com os participantes
Notícia de veículo de imprensa, tema ou história fictícia ligada com o problema a ser tratado – no caso, questões que problematizam os direitos humanos -, são materiais passíveis de utilização. É importante escolher um tema que possa interessar os participantes, com referências e outros materiais de apoio; de preferência, um problema discutido atualmente na imprensa, ou tema possivelmente relacionado às preocupações e afazeres do dia-a-dia dos participantes. O conteúdo precisa despertar a curiosidade, de modo que possam querer se expressar sobre ele. Nesse momento, a ênfase na idéia de que a realidade é constituída por consensos coletivos sobre fatos, objetos e estados de coisas dá validade e estimula novas interpretações a seu respeito (v. tópico 1 deste artigo). Isso porque essa perspectiva auxilia também na busca por uma melhor compreensão dos fatos, ainda que na forma de expressões artísticas. Uma discussão inicial sobre o tema pode ser feita com os participantes, para fins de esclarecimento ou para receber as primeiras opiniões e expressões.
Distribuição em modalidades artísticas e início das criações coletivas
A oficina continua com os participantes tomando lugar nas diferentes bases criativas, centradas cada uma numa modalidade artística distinta e com seus respectivos facilitadores. Atenção especial é dada para o método de criação, que se assemelha às sessões de improvisação e
brainstorming, como respectivamente realizadas no jazz e em práticas corriqueiras de publicitários, com os participantes utilizando também elementos das outras bases para suas criações. A idéia é que, sobre as bases comuns de linguagens intersubjetivamente partilhadas e o trabalho dos facilitadores, seja possível um livre fluxo de idéias e expressões também semelhante à livre associação da psicanálise freudiana, capaz de dar acesso a conteúdos inconscientes.
Como não se trata de chegar necessariamente a um consenso no plano ético da razão comunicativa, mas numa espécie de “consenso estético” (que tem sua eticidade cravada na autonomia de cada expressão individual, o que não deixa de ser também comunicativo, no sentido habermasiano), os resultados de oficinas anteriores do L’ArCA parecem demonstrar que quando se trata do fazer artístico compartilhado, há uma disposição maior para a composição de interesses do que em deliberações discursivas. Apesar de aparentemente óbvia, essa constatação refuta o argumento de que “gosto não se discute”.
Essa distribuição dos participantes em “bases” de diferentes modalidades artísticas não é essencial, mas contribui para que as pessoas possam escolher o que farão conforme suas aptidões pessoais e preferências. Além disso, forma grupos menores dentro dos quais a expressão individual não é sufocada pela coletiva, permitindo um trabalho colaborativo entre todos, porém diferenciado conforme as características pessoais de cada participante. A idéia de um jogo democrático em que a singularidade é respeitada se torna possível neste micro espaço público.
Por fim, segue-se à especificação das bases artísticas, coordenadas por facilitadores:
a) Literatura: responsável pela recriação da história, notícia ou tema em forma de versos livres. Preferencialmente composta com o auxílio de um computador capaz de projetar as palavras em uma tela no momento da criação.
b) Música: que fará a trilha sonora. Pode ser composta por instrumentos musicais simples e acústicos, como violões e percussão, ou também por instrumentos elétricos e bateria, de acordo com as proporções e condições do espaço a ser utilizado. Deverá criar os climas, a trilha sonora ou canção da oficina, com base especialmente nas criações da literatura, mas também do trabalho das artes plásticas e cênicas.
c) Artes Plásticas: montará os cenários e figurinos durante a dinâmica. Recomenda-se a utilização de material reciclável, como jornais e papelão, além de outros itens, como tintas, pincéis, giz, papel, flip-chart, bem como possíveis assessórios para compor o figurino, como maquiagem etc. Essa base também pode sugerir panos de fundo para os slides em que a base da literatura escreverá as letras/enredo, formando um material digital interessante para análise futura e divulgação dos resultados.
d) Artes Cênicas: fará a encenação da história recontada por meio da criação expressões corporais e dramatúrgicas, buscando influência nas outras bases e com dinâmicas e ensaios momentâneos dos participantes, coordenados pelo facilitador.
Os grupos trabalham e interagem durante um tempo fixo ou o necessário para compor, em conjunto, uma “música-teatralizada” (ou uma “peça-musical”) que reintepreta e reconta a notícia ou o tema, com toda a liberdade que linguagem artística permite. Finalizando as últimas preparações para obter o resultado, realiza-se uma apresentação final, da qual se recomenda registro em vídeo e/ou áudio. A apresentação pode ser seguida de uma rodada de comentários e impressões dos participantes. O material pode ser disponibilizado em um endereço eletrônico, para acesso dos participantes e outros interessados, o que o torna uma plataforma permanente da oficina, capaz de somar-se a outras iniciativas semelhantes e compor expressões digitais de espaços públicos estético-expressivos.
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Além de “Educação e Mídia”, os outros eixos do plano compreendem “Educação Básica”, “Educação Superior”, “Educação Não-Formal” e “Educação dos Profissionais dos Sistemas de Justiça e Segurança”. A respeito do eixo aqui trabalhado, o plano entende que “A mídia pode tanto cumprir um papel de reprodução ideológica que reforça o modelo de uma sociedade individualista, não-solidária e não-democrática, quanto exercer um papel fundamental na educação crítica em direitos humanos, em razão do seu enorme potencial para atingir todos os setores da sociedade com linguagens diferentes na divulgação de informações, na reprodução de valores e na propagação de idéias e saberes.” (PNEDH, 2006:53). Essa reflexão, que constitui uma das características mais peculiares do direito moderno para Habermas, permite revelar a co-originariedade entre princípios que eram vistos anteriormente como contraditórios e excludentes. Cf., para maior aprofundamento, Habermas. “O Estado Democrático de Direito – Uma amarração Paradoxal de Princípios Contraditórios?”. In. Id, Era das Transições, 2003, pp. 153-173. “A razão comunicativa possibilita, pois, uma orientação na base de pretensões de validade; no entanto, ela mesma não fornece nenhum tipo de indicação concreta para o desempenho de tarefas práticas, pois não é informativa, nem imediatamente prática. De um lado, ela abrange todo o espectro de pretensões de validade da verdade proposicional, da veracidade subjetiva e da correção normativa, indo além do âmbito exclusivamente moral e prático. De outro lado, ela se refere apenas às intelecções e asserções criticáveis e abertas a um esclarecimento argumentativo – permanecendo neste sentido aquém de uma razão prática, que visa à motivação e à condução da vontade. A normatividade no sentido de orientação obrigatória do agir não coincide com a racionalidade do agir orientado pelo entendimento em seu todo. Normatividade e racionalidade [comunicativa] cruzam-se no campo da fundamentação de intelecções morais, obtidas num enfoque hipotético, as quais detêm uma certa força de motivação racional, não sendo capazes, no entanto, de garantir por si mesmas a transposição das idéias para um agir motivado.” (tradução livre de: Habermas, Between Facts and Norms, 1996, p. 5. itálico do autor. grifos nossos) “O paradigma procedimental distingue-se dos concorrentes, não apenas por ser ‘formal’, no sentido de ‘vazio’ ou ‘pobre de conteúdo’. Pois a sociedade civil e a esfera pública política constituem para ele pontos de referência extremamente fortes, à luz dos quais, o processo democrático e a realização do sistema e direitos adquirem uma importância inusitada. Em sociedades complexas, as fontes mais escassas não são a produtividade de uma economia organizada pela economia de mercado, nem a capacidade de regulação da administração pública. O que importa preservar é, antes de tudo, a solidariedade social, em vias de degradação, e as fontes do equilíbrio da natureza, em vias de esgotamento. Ora, as forças da solidariedade social contemporânea só podem ser regeneradas através as práticas de autodeterminação comunicativa.” (Habermas, Direito e Democracia, vol. II, 1997, p. 189).